Direção da ANP 13-Dez-2012
O Diário da República de 14-Ago-2012 trouxe publicadas as leis com os números 30 (sobre obras em prédios arrendados), 31 (revendo a legislação sobre o arrendamento) e 32 (sobre reabilitação urbana). Só a prática nos dirá qual a intenção real destas leis e se elas cumprem o pretendido. Em todo o caso, é já possível formular uma opinião geral sobre este conjunto de legislação.
Arrendamento
No tocante à liberdade contratual progride-se significativamente, por exemplo, acabando com os prazos mínimos. Os prazos imperativos de pré-aviso são também encurtados, não se impedindo prazos maiores por acordo entre as partes.
Os processos de despejo em caso de não pagamento também parecem mais equitativos, abandonando-se o princípio da proteção sem limites do inquilino devedor. Por outro lado, a criação do Balcão Nacional de Arrendamento com um caráter centralizador, pode reduzir os custos do proprietário e acelerar o processo. Tal como pode evoluir para uma burocracia gigantesca e incapaz de dar seguimento até mesmo aos processos mais simples. A sua dependência hierárquica do Governo pode torná-lo num instrumento de ação política, limitando os direitos dos senhorios.
No tocante às rendas congeladas, pese o processo negocial previsto, tudo aponta para uma atualização para o valor anual igual a 6,66% do VPT (valor patrimonial tributário). Isto tanto para contratos habitacionais como não-habitacionais.
Porém, nos habitacionais estabelecem-se critérios de proteção tão alargados, tendo em conta os rendimentos do inquilino e respetivo agregado, que o impacto final será diminuto. Na verdade a aplicação da lei só terá impacto para os casos verdadeiramente escandalosos de altos rendimentos e rendas simbólicas. Apesar de tudo é um princípio e dá oportunidade de contar os casos verdadeiramente sociais, se o Estado a isso se dispuser. Queremos dizer que a aplicação da lei nesta fase pode ser um ponto partida para um efetivo processo de atualização das rendas congeladas habitacionais.
O contrato seguro de renda já foi criado pela ANP há mais de um ano e a sua consagração na lei só pode merecer aprovação.
Como princípio geral, a Direção da ANP entende que é preciso flexibilizar o mercado, dar-lhe segurança e garantias de que o congelamento não se repetirá. Este é o momento histórico da reconstrução da economia nacional. A mobilidade geográfica só se consegue com o arrendamento, é este mercado que pode também absorver uma parte do excesso de construção. Tudo aponta para necessidade de abandonar de vez as leis e os comportamentos que maltratam o proprietário e destroem a poupança.
Obras e reabilitação
Desde 2004 (decreto-lei 104/2004 de 7 de Maio) que se continua a publicação de legislação sobre a reabilitação urbana. A lógica permanece a mesma: (1) o município define as obras a efetuar; (2) o proprietário é intimado a fazer as obras; (3) se o proprietário não as fizer é expropriado e o município efetua-as, por intermédio de uma empresa adrede escolhida.
A persistência nestas leis não é novidade. Porém, as obras não estão já feitas porque o proprietário já perdeu tanto com o prédio que não tem recursos para perder ainda mais. Segundo, mesmo dando de barato o que já perdeu nunca seria capaz de reaver o que iria gastar. Portanto, caberá ao município proceder às obras, para tanto recorrendo aos dinheiros públicos, isto é aos impostos, num momento de tantas dificuldades.
Como em tudo, nos prédios há o bonito e o feio, há o que serve e o que não serve. Há habitações que não servem mas que aumentariam o seu conforto (e beleza) com uma modesta intervenção e deixar-se-ia para um futuro mais abastado as grandes questões estéticas. Mesmo sem alterar significativamente as rendas, recorrendo a materiais modernos, com uma pequena ajuda do Estado, algumas pessoas que vivem em condições deploráveis poderiam melhorar o seu conforto.
O problema é que isso seriam obras para pequenos empreiteiros, daqueles que se moderam nos preços. Melhorar a vida das pessoas por esta via não dá oportunidades de empreitadas aos construtores que tinham o Estado por cliente ou que simplesmente aproveitaram a onda da habitação própria. E com tanta energia o fizeram que hoje há um excesso de oferta de habitação, o que leva a ponderar nas vantagens de reabilitar habitação em mau estado, deixando a habitação nova sem uso.
É assim que se pode entender o artigo 10º da lei 32, o qual parece estar a criar oportunidades para empresas bem relacionadas a nível local. Num país arruinado, em que prevalece a ideia de que os sacrifícios são só para alguns, não parece próprio levar por diante os propósitos desta lei.
Lisboa, 20 de Setembro de 2012
António Frias Marques Sílvia Vasques de Sousa Henrique Branquinho de Oliveira Sérgio Infante Artur Soares Alves |