Cartório Notarial. Doação

 

Alexandre de Oliveira Perdigão

25-Out-2012

 

 

(i) Noção e forma

 

A doação é definida pela lei como o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente.

 

Em termos simples, verifica-se quando uma pessoa, por sua livre iniciativa e, regra geral, sem receber o que quer que seja em troca, transmite um seu bem ou direito, ou assume uma qualquer obrigação, a ou em favor de outra pessoa.

 

O contrato não está sujeito a forma especial quando a doação respeite a coisas móveis e seja acompanhada da entrega – tradição - das mesmas a quem dela beneficia — o donatário. Deve, contudo, ser reduzido a escrito quando essa tradição se não verifique ou ainda celebrado por escritura pública ou documento particular autenticado quando estejam em causa bens imóveis ou direitos sobre eles.

 

(ii) Doações a menores ou outros incapazes

 

O contrato de doação é, geralmente, um contrato bilateral, o que vale por dizer que exige a intervenção de ambas as partes. No entanto, a lei admite doações a favor de menores ou outros incapazes, independentemente de aceitação, desde que delas não resulte a imposição de quaisquer encargos àqueles menores ou incapazes. São as chamadas doações puras.

 

(iii) Doações entre casados

 

Já nas doações entre casados verificam-se algumas especificidades que importa destacar.

 

Com efeito, só podem ser objeto de doação a favor do outro cônjuge bens ou direitos próprios do doador, não ocorrendo a comunicabilidade dos bens doados seja qual for o regime de bens em vigor.

 

Todas as doações entre casados devem obrigatoriamente constar de documento escrito, ainda que tenham por objeto bens móveis e sejam acompanhadas de tradição da coisa, e são nulas quando entre eles vigore o regime imperativo da separação de bens.

 

Os cônjuges estão também impedidos de fazer doações recíprocas no mesmo ato.

 

Para além disso, as doações entre casados caducam se o cônjuge donatário morrer antes do doador — sem prejuízo da possibilidade de este confirmar a doação após a morte do outro — se o casamento vier a ser declarado nulo ou anulado, ou em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens por culpa do donatário, se este for considerado único ou principal culpado.

 

(iv) Reserva de usufruto

 

A figura da doação é de ocorrência relativamente frequente na atividade notarial, sendo também, em boa parte das vezes, acompanhada da reserva, a favor do doador ou doadores, do direito de usufruto sobre o bem doado.

 

Caso típico é o dos pais que doam a um filho um determinado bem imóvel mas reservam para si o usufruto sobre esse mesmo bem, permitindo-lhes continuar a usá-lo e a frui-lo durante um determinado período de tempo.

 

O usufruto pode ser reservado a favor do próprio doador ou a favor de terceiro (pense-se, por exemplo, na situação em que a mãe doa ao filho uma casa que constitui seu bem próprio e reserva o usufruto a seu favor e do seu marido, ou ainda quando os avós doam ao neto e reservam o usufruto a favor da filha).

 

Aproveitando a oportunidade, e apesar de já algo fora do âmbito deste escrito, diga-se também que o usufruto pode ser reservado a título temporário ou vitalício, e ainda simultânea e/ou sucessivamente, quando exista mais do que um usufrutuário e aquele direito deva extinguir-se apenas com a morte do último. É aqui que o até então titular da raiz ou nua propriedade vê o seu direito consolidar-se com o de usufruto, passando, finalmente, a ser o titular do direito de propriedade plena sobre o bem ou direito doado.

 

A reserva do direito de usufruto, ainda que a favor do próprio doador, é um facto sujeito a registo predial, a par da doação em si mesma, sendo, por isso, devidos emolumentos pelo registo de ambos os factos.

 

(v) Revogação da doação. O caso especial das doações entre casados

 

Por regra admite-se a revogação da doação apenas nas situações de ingratidão do donatário, o que acontece quando o donatário se torne incapaz, por indignidade, de suceder ao doador, ou se verifique alguma das ocorrências que possam justificar a sua deserdação.

 

Ao invés, as doações entre casados podem ser revogadas, livremente e a todo o tempo, pelo doador, a quem está vedada a possibilidade de renunciar a esse direito.

 

(vi) Regime fiscal da doação

 

Finalmente, uma breve nota para o regime fiscal da doação.

 

Como negócio gratuito que é, a doação não cria na esfera jurídica do doador qualquer encargo fiscal, como seja a tributação em sede de mais-valias, à semelhança do que acontece no caso da compra e venda ou outras transmissões a título oneroso.

 

O mesmo não se pode dizer do donatário, que, desde a reforma da tributação do património, em 2004, está sujeito ao pagamento do imposto do selo.

 

No âmbito daquela reforma foi abolido o antigo imposto sobre as sucessões e doações e enxertado o respetivo regime no quadro do histórico imposto do selo.

 

E se, por um lado, as transmissões gratuitas passaram a ser tributadas a uma taxa única de dez por cento sobre o valor dos bens ou direitos doados declarado pelas partes (ou, quando em presença de bens imóveis, ou direitos sobre eles, do respetivo valor patrimonial, se superior), por outro foram arredadas da tributação as transmissões gratuitas a favor do cônjuge, descendentes ou ascendentes, que dele passaram a estar isentas.

 

Isto, há que fazer notar, somente em relação ao imposto do selo enxertado, que veio substituir o mencionado imposto sobre as sucessões e doações em 2004. Porque, no tocante ao imposto do selo clássico, continua a ser objeto de tributação a aquisição […] por doação do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito sobre imóveis, à taxa de 0,8% sobre o valor declarado (ou do respetivo valor patrimonial, se superior) mesmo tratando-se de doação ao cônjuge, descendentes ou ascendentes.

 

A participação da doação para efeitos de liquidação do imposto do selo, que é obrigatória mesmo em caso de isenção, deve ser entregue até ao final do terceiro mês seguinte à data daquela.

 

FIM

  

 

  
 
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