Sílvia Vasques de Sousa 16-Fev-2012
Os Julgados de Paz são tribunais com características especiais, competentes para resolver causas de valor reduzido de natureza cível, com exceção daquelas que envolvam matérias de Direito de Família, de Sucessões e de Trabalho, de forma rápida, eficiente e a custos reduzidos.
Possuem competência para apreciar e decidir ações declarativas cíveis, cujo valor não exceda os 5.000,00 €, (têm competência para questões cujo valor não exceda a alçada do tribunal de 1ª instância), podendo resolver casos de incumprimento de contratos e obrigações, de responsabilidade civil — contratual e extracontratual, assim como de direito sobre bens móveis ou imóveis — como, por exemplo, propriedade, condomínio, escoamento natural de águas, comunhão de valas, abertura de janelas, portas e varandas, plantação de árvores e arbustos, paredes e muros divisórios.
Casos concretos
No que nos interessa mais (a propriedade), podemos contar com a sua atuação nos casos concretos: · Ações destinadas a efetivar o cumprimento de obrigações, com exceção das que tenham por objeto prestação pecuniária e de que seja ou tenha sido credor originário uma pessoa coletiva; · Ações de entrega de coisas móveis; · Ações resultantes de direitos e deveres de condóminos, sempre que a respetiva assembleia não tenha deliberado sobre a obrigatoriedade de compromisso arbitral para a resolução de litígios entre condóminos ou entre os condóminos e o administrador; · Ações de resolução de litígios entre proprietários de prédios relativos a passagem forçada momentânea, escoamento natural de águas, obras defensivas das mesmas, comunhão de valas, regueiros e valados, sebes vivas; abertura de janelas, portas, varandas e obras semelhantes; estilicídio, plantação de árvores e arbustos, paredes e muros divisórios; · Ações possessórias, usucapião e acessão; · Ações que digam respeito ao direito de uso e administração da compropriedade, da superfície, do usufruto, de uso e habitação e ao direito real de habitação periódica; · Ações que respeitem ao arrendamento urbano, exceto as ações de despejo; · Ações que digam respeito à responsabilidade civil contratual e extracontratual; · Ações que respeitem a incumprimento contratual, exceto contrato de trabalho e arrendamento rural; · Ações que respeitem à garantia geral das obrigações.
Além disso também têm competência para resolver questões de acidentes de viação.
Convém assinalar que os Julgados de Paz são competentes e podem servir os proprietários de imóveis no caso em que contra o perdão das rendas vencidas se proceda à desocupação voluntária do locado e se receba a chave.
Procedem, ainda, à apreciação de pedidos de indemnização cível, apenas quando não tenha sido apresentada participação criminal ou após desistência da mesma. São disso exemplo as ofensas corporais simples, a ofensa à integridade física por negligência, a difamação e injúrias, furto e danos simples, alteração de marcos e burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços. Todas as questões que estes Tribunais podem resolver encontram-se elencadas no artigo 9º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho.
Princípios de simplicidade
Segundo esta Lei, no seu artigo 2º, podemos observar os seus princípios gerais:
1 – A atuação dos Julgados de Paz é vocacionada para permitir a participação cívica dos interessados e para estimular a justa composição dos litígios por acordo das partes.
2 – Os procedimentos nos Julgados de Paz estão concebidos e são orientados por princípios de simplicidade, adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual.
Quanto à sua criação e instalação (artigo 3º) estes tribunais são criados por diploma do Governo, ouvidos o Conselho Superior de Magistratura, a Ordem dos Advogados, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias. O diploma de criação define a circunscrição territorial do Julgado de Paz, sendo a sua instalação feita por portaria do Ministério da Justiça.
Os Julgados de Paz podem ser concelhios, de agrupamento de concelhos contíguos, de freguesia ou de agrupamentos de freguesias contíguas do mesmo concelho. Têm sede no concelho ou na freguesia para que são exclusivamente criados, ou, no caso de agrupamentos de concelhos ou freguesias, ficam sediados no concelho ou freguesia que, para o efeito, é designado no diploma de criação. Dentro da respetiva área de circunscrição podem funcionar em qualquer lugar apropriado e podem estabelecer diferentes locais para a prática de atos processuais.
Custos módicos
Nos Julgados de Paz há lugar a pagamento de custas, cuja tabela é aprovada por portaria do Ministro da Justiça. Os custos devidos no final são fixos — taxa única de 70,00 € — a cargo da parte vencida ou repartidos entre o demandante e o demandado, na percentagem que for determinada pelo Juiz de Paz, isto no caso de o processo terminar por conciliação ou tal venha a resultar da sentença proferida. Há ainda a possibilidade de a taxa ser reduzida para 50,00 €, no caso de o processo ser concluído por acordo alcançado através de mediação.
As partes têm de comparecer pessoalmente, por causa dos objetivos de mediação, conciliação e pacificação. Além disso, podem sempre fazer-se acompanhar por um advogado, advogado estagiário ou por um solicitador. Esta assistência torna-se obrigatória relativamente a qualquer parte que seja cega, surda, muda, analfabeta, desconhecedora da língua portuguesa ou, se por qualquer outro motivo, se encontre numa posição de manifesta inferioridade. É também obrigatória a constituição de advogado na fase de recurso, se a ela houver lugar.
Em caso de necessidade pode ser concedido apoio judiciário, com vista ao pagamento da retribuição do mediador.
Em caso de necessidade deste serviço, deve dirigir-se ao Serviço de Atendimento da Sede do Julgado de Paz.
Um Julgado de Paz junto de si
Se o Julgado de Paz for de Agrupamento de Concelhos, os interessados podem dirigir-se não apenas à sua Sede, como também às Delegações e/ou Postos de Atendimento. E, acreditem, já existem muitos, nomeadamente:
· J.P. Agrupamento Concelhos de Aguiar da Beira, Penalva do Castelo, Sátão, Trancoso e Vila Nova de Paiva · J.P. Agrupamento Concelhos de Alcobaça, Caldas da Rainha, Óbidos e Nazaré · J.P. Agrupamento Concelhos de Aljustrel, Almodôvar, Castro Verde, Mértola e Ourique · J.P. Agrupamento Concelhos de Câmara de Lobos e Funchal · J.P. Agrupamento Concelhos de Cantanhede, Mira e Montemor-o-Velho · J.P. Agrupamento Concelhos de Carregal do Sal, Mangualde e Nelas · J.P. Concelho de Coimbra · J.P. Concelho de Lisboa · J.P. Concelho de Miranda do Corvo · J.P. Concelho de Odivelas · J.P. Agrupamento Concelhos de Oleiros, Mação, Proença-a-Nova, Sertã e Vila de Rei · J.P. Agrupamento de Concelhos de Oliveira do Bairro, Águeda, Anadia e Mealhada · J.P. Concelho do Porto · J.P. Concelho de Santa Maria da Feira · J.P. Agrupamento Concelhos de Santa Maria de Penaguião, Alijó, Murça, Peso da Régua, Sabrosa e Vila Real · J.P. Concelho do Seixal · J.P. Concelho de Setúbal/Palmela · J.P. Concelho de Sintra · J.P. Agrupamento Concelhos de Tarouca, Armamar, Castro Daire, Lamego, Moimenta da Beira e Resende · J.P. Concelho de Terras de Bouro · J.P. Concelho da Trofa · J.P. Concelho de Vila Nova de Gaia · J.P. Concelho de Vila Nova de Poiares.
Os conflitos podem ser resolvidos por Mediação, se essa for a opção de ambas as partes, com a intervenção de um Mediador de Conflitos ou por Julgamento, realizado por um Juiz de Paz.
Mas afinal qual é a diferença?
Mediação é uma forma voluntária e confidencial de resolução de litígios em que as partes, de uma forma simples e participativa, auxiliados por um Mediador de Conflitos, procuram alcançar uma solução que a ambas satisfaça para o litígio que as opõe, a qual termina com a homologação, pelo Juiz de Paz, por decisão com o valor de sentença. Se não houver acordo homologado ou se uma das partes rejeitar a mediação, passa-se, logo que findos os articulados, à fase do julgamento.
Os Mediadores que colaboram com os Julgados de Paz são profissionais independentes, adequadamente habilitados a prestar serviços de mediação. Devem proceder com imparcialidade, independência, credibilidade, competência, confidencialidade e diligência, além de estarem impedidos de exercer a advocacia no Julgado de Paz onde prestam serviço. Para se ser Mediador de um Julgado de Paz tem que se ter mais de vinte e cinco anos de idade e estar no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos além de possuir uma licenciatura adequada, além de se estar habilitado com um curso de mediação reconhecido pelo Ministério da Justiça. Não se pode ter sofrido condenação nem estar pronunciado por crime doloso. Além de possuir o perfeito domínio da língua portuguesa tem que se ser preferencialmente residente na área territorial abrangida pelo Julgado de Paz.
A Mediação é uma modalidade extrajudicial de resolução de litígios, de carácter privado, informal, confidencial, voluntário e natureza não contenciosa em que, com a sua participação ativa e direta, as partes são auxiliadas por um mediador a encontrar, por si próprias, uma solução negociada e amigável para o conflito que as opõe. O mediador é pois uma terceira pessoa, neutra, independente e imparcial, que não possui poderes de imposição sobre os mediados de uma decisão vinculativa. Só lhe compete organizar e dirigir a mediação, procurando conseguir o mais justo resultado útil na obtenção da resolução dos problemas, que satisfaça ambas as partes.
Juízes de Paz
Quanto aos Juízes de Paz, têm que possuir, cumulativamente vários requisitos: ter nacionalidade portuguesa além de possuir uma licenciatura em Direito. Têm que ter idade superior a 30 anos e estar no pleno gozo dos direitos civis e políticos. Também não podem ter sofrido condenação nem estar pronunciados por crime doloso. É imprescindível que tenham cessado ou fazer cessar imediatamente, antes da assunção das funções como Juiz de Paz, a prática de qualquer outra atividade pública ou privada. São empossados por período de três anos e são nomeados pelo Conselho de Acompanhamento a que se refere o artigo 65º da Lei em análise, que exerce sobre os mesmos o poder disciplinar.
Compete ao Juiz de Paz proferir, de acordo com a lei ou equidade, as decisões relativas a questões que sejam submetidas aos Julgados de Paz, devendo, previamente, procurar conciliar as partes. Não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo, se as partes concordarem, decidir segundo juízos de equidade quando o valor da ação não exceda metade do valor da alçada do tribunal de 1ª instância.
O Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz é um órgão que funciona junto da Assembleia da República, com mandato de Legislatura, e tem por competência, nos termos do artigo 25º e 65º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho, o seguinte:
· Nomear os Juízes de Paz; · Exercer sobre os mesmos o poder disciplinar (lato sensu); · Acompanhar a criação e instalação além do funcionamento destes Julgados de Paz; · Apresentar um relatório anual de avaliação à Assembleia da República entre 1 e 15 de Junho de cada ano, formulando sugestões de alteração do presente diploma entre outras recomendações que devam ser tidas em conta, designadamente, pelo Governo ou Assembleia da República, no desenvolvimento do projeto.
Como se concluem os processos?
Por sentença do Juiz de Paz, quer seja a homologação do Acordo de Mediação, quer a proferida no termo da Audiência de Julgamento.
Se as partes chegarem a acordo, este é reduzido a escrito e assinado por todos os intervenientes, para imediata homologação pelo Juiz de Paz, tendo valor de sentença. Se não chegarem ou se só o atingirem de uma forma parcial, o Mediador comunica o facto ao Juiz que marcará o dia para a audiência de julgamento, do qual são as partes notificadas. Esta audiência será marcada com o prazo máximo de dez dias contados a partir da data da notificação das partes. Nesta audiência do julgamento, serão ouvidas as partes interessadas, produzida a prova e proferida a sentença que por sua vez, será reduzida a escrito, dela constando a identificação das partes, o objeto do litígio, uma fundamentação muito sucinta e a decisão propriamente dita. Termina com o local e a data em que foi proferida, acrescentando a identificação e a assinatura do Juiz de Paz que a proferiu.
É possível recorrer da Sentença para o Tribunal de Comarca ou para o Tribunal de Competência Específica que for competente, desde que o valor da ação seja superior a 2.500,00 €.
Esperamos que nunca tenham litígios, mas, em caso afirmativo, desejamos sinceramente que esta rápida explicação vos tenha elucidado o suficiente para poderem optar por ela, ou não…
FIM |