Senhorios à Espera de Luz Verde das Finanças

 

Natacha Palma[i]

13-Jun-2013

 

 

A esmagadora maioria dos processos de atualização de rendas está suspensa. Tudo porque cerca de 75% dos inquilinos invocou carência económica e para o provar tem de apresentar aos senhorios a declaração do Rendimento Anual Bruto Corrigido (RABC) dos respetivos agregados familiares, documento esse que ainda não está a ser emitido. A bola de jogo está, então, no campo das Finanças que, atualmente em período de receção das declarações de IRS, continuam de mãos atadas e a ver a pilha de pedidos a aumentar de dia para dia.

 

Ainda assim, e ao contrário do previsto por muitos, seis meses decorridos após a entrada em vigor da já famosa Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, e em jeito de balanço, o processo de atualização de rendas está a decorrer, de uma forma geral, sem sobressaltos. Quem o diz é o presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP), António Frias Marques.

 

“Julgo que ninguém esperava que fossem tantos a invocar dificuldades económicas, o que me leva a concluir que Portugal é, infelizmente, um país de pelintras. Tal só prova quão baixos são os rendimentos de grande parte dos portugueses. Isso sim, é que é um escândalo”, comentou. “De qualquer forma, do nosso ponto de vista, está tudo a correr bem, até porque os inquilinos já perceberam que os senhorios não os vão colocar na rua por não terem meios para pagar as novas rendas. Eles têm direito a invocar carência económica e estão a fazê-lo. Ninguém quer explorar ninguém”, continuou António Frias Marques.

 

Conhecendo bem os inquilinos, muitos deles desde a sua infância, são muitos os proprietários que nem pensaram duas vezes ao calcular as novas rendas a propor. Pediram apenas e só 1/15 do Valor Patrimonial Tributário (VPT) dos imóveis arrendados, mesmo em casos a que isso não eram obrigados.

 

“Não fiz aumentos exorbitantes, porque tenho noção da situação do país. Tenho respeito pelos meus inquilinos. Alguns andaram comigo ao colo”, contou Veríssimo Santos, associado n.º 2974. “Pedi apenas o que a Lei prevê. Depois, compreendi que muitos deles estão a passar por sérias dificuldades e então negociei com eles valores ainda mais baixos. A verdade é que também não queria que fossem embora. Prefiro receber menos, mas ter a certeza que as minhas propriedades estão nas mãos de pessoas em que confio e que sempre pagaram a tempo e horas”, acrescentou.

 

Uma luz ao fundo do túnel

 

No caso da associada n.º 3057, Teresa Pessoa, a nova lei foi “uma luz ao fundo do túnel”.

 

“Durante 11 anos fui obrigada a viver com a minha família num anexo da casa dos meus pais, isto apesar de ter uma moradia. Só que estava arrendada por um valor tão irrisório que não me permitia comprar habitação própria ou mesmo arrendar. Tentei ficar com a casa para mim, ganhei a causa em tribunal, mas perdia-a na Relação. Foi um golpe muito duro”, explicou Teresa Pessoa. “Agora, as dificuldades são outras. Tenho um filho a estudar e outro casado e quase metade do rendimento dele e da mulher vão para a renda da casa onde moram. Gostava de os poder ajudar, mas a renda que recebo da tal moradia não me permitiu fazê-lo até agora”, continuou. “Propus ao inquilino apenas 1/15 do VPT e só isso me bastará para ajudar os meus filhos a ter mais folga na vida, que bem o merecem”, concluiu Teresa Pessoa, apenas uma entre os muitos proprietários que há anos ansiavam por esta lei.

 

“A Lei n.º 6 /2006, de 27 de fevereiro, não veio resolver nada. Permitia o aumento da renda, faseado ao longo de vários anos, em função do estado de conservação dos imóveis. Estima-se que apenas em relação a 3 mil arrendatários, num universo de 400.000, a que correspondem cerca de 85 mil senhorios em Portugal se tenha optado por essa via”, recordou António Frias Marques. “A nova lei tem imperfeições e é lamentável que as tenha, mas sempre é melhor que nada e do que estava para trás”, fez notar.

 

Imóveis degradados

 

“O problema das rendas terem ficado congeladas durante tanto tempo e depois terem sido objeto de aumentos insignificantes fez com que os senhorios não tivessem condições monetárias para fazer obras nos imóveis, daí estarem hoje tantos prédios degradados”, salientou Margarida Lopes, associada n.º 3195, que já conta com pedidos de obras por parte dos inquilinos agora que as rendas vão ser atualizadas, embora saiba que tal questão é totalmente independente do processo de atualização de renda.

 

 “Sou a primeira interessada em manter o meu património em boas condições, mas com rendas de 30 euros como é que eu podia fazer alguma coisa”, questionou Margarida Lopes.

 

Manuel Ferreira, associado n.º 2963, foi, por sua vez, surpreendido por um dos inquilinos que, não aceitando o novo valor de renda proposto, mais uma vez 1/15 do VPT, pediu a denúncia do contrato e reclamou uma indemnização por obras feitas ao longo dos anos, obras essas que não foram autorizadas e nem sequer eram do conhecimento do senhorio.

 

“Fiz sempre tudo conforme a lei. Esperei pela nova legislação, não criei quaisquer expectativas e depois pedi apenas o que estava previsto, isto apesar do inquilino em causa ter menos de 65 anos, o que me permitiria até pedir mais. Não contava com tal atitude”, confessou Manuel Ferreira.

 

“Aumentar uma renda de 100 para 500 euros é pesado, mas também não é justo vermos casas com condições bem piores a render muito mais. Havia que repor a justiça e é isso que se espera que aconteça agora”, concluiu.



[i] Coordenadora da Delegação do Porto da ANP

 

 

  
 
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